segunda-feira, 29 de setembro de 2008

As 7 Faces do Doutor Lao

Hoje em dia Steven Spielberg e George Lucas são sinônimos de diversão e entretenimento. São visionários e criativos. A seu modo nos contam um conto de fadas. E antes? Havia mais gente: Jack Arnold, Nathan Juran, Ray Harry Hausen e muitos outros.


Mas destes havia um que possuía uma mística, uma capacidade de nos transmitir uma lição de moral, sem estresses e de maneira adorável. Suas fábulas eram um misto de aventura, ficção, drama, questões adultas, porém, ao mesmo tempo infantil. A alegria, a decepção, o medo, a raiva e a tristeza eram trabalhados num misto de ingenuidade e genialidade. George Pal tinha a alma de Peter Pan: recusava-se a crescer o eterno menino que criou obras de vulto. Tentar comparar sua A Máquina do Tempo (1960) com a refilmagem de 2002 não tem sentido, posto que a segunda não possui sequer a mística da original.

As Sete Faces do Doutor Lao (Seven Face of Dr. Lao – 1964) nunca foi refilmado e dificilmente poderá sê-lo, pois tantas são as qualidades. Na modesta cidade de Abalone seus cidadãos estão diante de um dilema: vender suas propriedades para um rico fazendeiro. Um jornal local defende a permanência, mas está perdendo a causa. Surge então o Circo do Doutor Lao. Na verdade, do nada, pois nosso velhinho chinês chega num jumento.


Tony Randal interpreta o Doutor Lao, além de outros seis personagens (Merlin, Pan, Apolônio de Tiana, o Abominável Homem das Neves, a Serpente e Medusa). Tão polivalente quanto o sábio chinês, apresenta nossos pecados, nossas fraquezas. Não se amedronta diante do poderoso fazendeiro, ao contrário, convida-o e em seu circo conhece uma de suas faces (numa autoparódia). Ao final, incita os cidadãos a decidirem por seus destinos. Muita alegoria é empregada, inclusive quanto ao “dragão”, que apesar das constantes advertências, mais parece um girino num aquário que vive cuspindo para fora. Mas aí se dá a verdadeira magia de George Pal: se tudo não é o que aparenta ser, na verdade o que é o “dragão”? Os capangas do fazendeiro derrubam o aquário do bicho desaforado e na verdade descobrem que ele é... um gigantesco dragão!

Moral da história: nem tudo é o que aparenta ser, nem sempre aparentamos o que realmente somos, mas muito cuidado devemos tomar quando um sábio nos previne diante do mal e lhe damos as costas. RECOMENDO, mesmo porque em algum momento de nossas vidas, diante de um dilema, surge um velhinho chinês, que do nada, nos apresenta um circo em que somos as principais atrações!



sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Mary Poppins

Este é com certeza, um dos maiores clássicos da Disney em toda a sua história. “Mary Poppins” marcou várias gerações e, com certeza os mais velhos assistiram muito o filme nas matinês da sessão da tarde. Mesmo tendo envelhecido um pouco, a história da babá misteriosa de poderes mágicos que vai trabalhar na casa de um banqueiro para cuidar de um casal de filhos, e transforma a vida de todos com seu jeito diferente e mágico de fazer as coisas é, até hoje, fascinante.

Cada vez que Mary Poppins usa sua magia, tornando tudo mais divertido e colorido, somos embarcados em um mundo de fantasias onde tudo é possível, e ao som de muita música e dança. Muita mesmo, aliás essa é a única falha do filme, o excesso de números musicais, apesar de serem ótimos (a cena da dança nas chaminés é sensacional). Ainda assim o filme é ótimo. A sua parte técnica não deixa a desejar, com uma direção de arte fabulosa, fotografia e trilha sonora contagiantes, além de efeitos especiais muito bons para a época.


O elenco dá um show, Julie Andrews (em sua estréia nas telas) segura bem sua personagem, mostrando talento e carisma. Dick Van Dyke rouba a cena sempre que aparece na tela, com seu jeito cativante, e seus divertidos números musicais. As crianças Jane (Karen Dotrice) e Michael (Matthew Garber) são incríveis, encantam a todos. A trama é baseada no livro de P. L. Travers, e era um dos projeto que Walt Disney sempre quis fazer. Enfim, “Mary Poppins” é um filme inesquecível que marcou a infância de muita gente. Seria bom que as crianças de hoje também se deliciassem com canções tão divertidas como “Supercalifragalisticexpialidocious”. É um verdadeiro clássico infantil para toda a família ver.

Ganhador do Oscar e do Globo de Ouro de 1965.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Antes de Partir

A comédia dramática se justifica e se apóia, independente de qualquer outra coisa, no carisma de Jack Nicholson e Morgan Freeman.

Nicholson vive Edward Cole, milionário gestor de hospitais cujo lema é um número: dois leitos por quarto, nunca menos. Freeman é Carter Chambers, um mecânico que abandonou seus sonhos de juventude quando viu que teria uma família para alimentar. Quando os dois ficam fulminantemente doentes, seus caminhos se cruzam.

E se cruzam porque, para não desonrar seu lema, Edward, o dono do hospital, acaba no mesmo quarto de Carter. O estranhamento inicial logo se transforma em apoio mútuo. Ambos têm poucos meses de vida, e só um doente terminal para entender o tipo de drama que o outro vivencia. Do nada, Edward convence Carter a fugir e botar em prática uma lista de últimos - e excêntricos - desejos antes de "baterem as botas". Nos EUA, a expressão usada nesses casos é "chutar o balde", daí o título original do filme, A Lista do Balde.

Pouco antes das filmagens, por uma funesta coincidência, Nicholson teve que ser submetido a uma intervenção cirúrgica que o deixou de molho por meses. O fato de interpretar um personagem turrão à beira da morte evidentemente transtornou o ator - e o filme se beneficia do estado de espírito indômito de Nicholson. Ele atua com um senso de urgência que enriquece o personagem, em interessante contraste com a pose sempre professoral de Freeman.

Gostei muito deste filme. Ensina a acreditar na felicidade mesmo quando ela parece inatingível; ensina a acreditar nos sonhos, mesmo que o fim esteja próximo; relembra que sempre deve-se haver esperanças, mesmo quando tudo parece muito mais que perdido.

Como curiosidade, gostei de saber que Alfonso Freeman, filho de Morgan Freeman, interpreta seu filho neste filme.

sábado, 19 de julho de 2008

Os Girassóis da Rússia

Marcello Mastroianni (de “A Doce Vida”) e Sophia Loren (de “A Queda do Império Romano”), a dupla dinâmica do Cinema Italiano que fez bastante sucesso entre as décadas de 60 e 70, gravou esse filme em 1969-70, dirigido por Vittorio de Sica (“Ladrão de Bicicletas”).Os três já haviam trabalhado juntos em 1963, em “Ontem, Hoje e Amanhã”.
A parceria entre Loren e Mastroianni perdurou por mais 5 filmes.No total, eles tiveram 12 trabalhos em comum (o primeiro foi em 1950 e o último em 94, dois anos antes da morte de Marcello) e foram, creio eu, grandes representantes do excelente Cinema Italiano pelo mundão afora.

Giovanna e Antonio, recém-casados, são separados quando, por artimanhas malucas do destino, ele é convocado pelas tropas italianas a partir para a Rússia em defesa de seus país, que enfrentava a Segunda Guerra Mundial.
Antonio vai e nunca mais dá notícias. Simplesmente desaparece sem deixar pistas: as forças armadas o consideram morto. Inconformada e crente de que seu marido não morreu, Giovanna vai à Rússia procurá-lo. Qual não é sua surpresa quando ela encontra Antonio, mas não seu marido.

“I Girasoli” foi gravado parte na Itália, parte na Rússia.Tem uma trilha sonora muito bonita e várias cenas memoráveis, como a que mostra Giovanna procurando, um por um, o túmulo do esposo num imenso campo de girassóis e as lindas cenas de despedida e reencontro das personagens.

sexta-feira, 30 de maio de 2008

Como Água Para Chocolate


O filme mexicano Como Água Para Chocolate, de 1992, é baseado no livro homônimo de Laura Esquivel e carrega uma forte dose do realismo fantástico latino-americano que Gabriel Garcia Marquez e Juan Rulfo tornaram famoso, só que um toque mais feminino e menos árido - um pouco menos, apenas.

A história do amor entre Tita (Lumi Cavazos) e Pedro (o ator italiano Marco Leonardi) é contada por uma descendente de ambos entre rios de lágrimas - mas o filme de jeito nenhum é triste, por exemplo, a cena inicial: "quando as lágrimas que derramou ao nascer finalmente secaram, viram que o que restou foram vinte quilos de sal - que usaram para cozinhar por muitos anos".

O filme dirigido por Alfonso Arau acabou por derivar outro livro, a compilação de receitas Apetite por paixão, prefaciado pela própria Laura Esquivel; infelizmente não são as mesmas receitas que Tita cozinha (como as codornizes ao molho de pétalas de rosas) mas não faz mal porque, ela mesma repete ao longo do filme, o segredo é fazê-las com muito amor.

Uma curiosidade: A personagem Esperanza, quando adulta, foi interpretada por Sandra Arau Esquivel, filha do diretor e da autora/roteirista que acabou por seguir a carreira do pai.

domingo, 18 de maio de 2008

O Carteiro e o Poeta


O filme O carteiro e o Poeta (Il postino, 1994), de Michael Radford, narra a história (fictícia) da amizade entre o poeta chileno Pablo Neruda (Philippe Noiret) e Mario Ruppuolo (Massimo Troisi), carteiro incumbido de entregar a sua abundante correspondência.
A princípio distante, o poeta acaba cativado pela candura do carteiro, o qual, por sua vez, fica encantado com essa aproximação. Apaixonado pela filha da proprietária da taverna local, a bela Beatrice Russo (Maria Grazia Cucinotta), Mario tem a esperança de que "Don Pablo" o ajude a conquistar o coração da sua amada. A história se passa numa ilha de pescadores no sul da Itália, começo da década de 1950, onde Neruda se encontrava exilado.
O maior trunfo de O Carteiro e o Poeta é a irresistível interpretação de Massimo Troisi. O ator constrói seu personagem na medida certa, quase minimalista, em delicados meios-tons: contido, hesitante, tímido, deixando a emoção fluir com um misto de recato e humor. Para contrabalançar, o Neruda de Philippe Noiret (o grande ator francês de Cinema Paradiso, de Giuseppe Tornatore, entre muitos outros) é um indivíduo em plena maturidade artística e emocional, autoconfiante e ciente do próprio charme e da admiração que sua figura pública provoca.
Foi um filme recebido com grande emoção pelo público na época do lançamento. Foi candidato ao Oscar de Melhor Filme de 1996 - desde 1973, ano em que Gritos e Sussurros, obra-prima de Ingmar Bergman, foi um dos indicados, um filme de língua não inglesa não era escolhido para ser um dos cinco finalistas do prêmio - e também concorreu aos prêmios de direção, ator (Massimo Troisi), roteiro adaptado e música (Luis Henrique Bacalov), mas ganhou apenas nessa última categoria.
O ator e roteirista Massimo Troisi, 41 anos, que sofria de uma cardiopatia, morreu no dia seguinte ao término das filmagens.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Doutor Jivago


Épico baseado no romance homônimo de Boris Pasternak, Dr. Jivago virou fenômeno. As platéias se emocionaram com a história de um médico e poeta que inicialmente apoia a revolução Russa, mas, aos poucos, se desilude com o socialismo e se divide entre dois amores: a esposa Tania (Geraldine Chaplin) e a bela plebéia Lara (Julie Christie).

Jivago conhecera Lara no leito de morte de sua mãe, onde ela foi seduzida pelo desonesto e devasso amante da mãe, Victor Komarovsky (Rod Steiger). Mais tarde, ao vê-la entrar numa festa de casamento, Jivago percebe-se fuzilando Komarovsky, e começa a compreender seus sentimentos e o que ele vai carregar através de seu casamento. Mais tarde, Lara se casa com o jovem idealista Pasha Antipov (Tom Courtenay). As vicissitudes da história unem e separam Lara e Jivago diversas vezes. O labirinto de encontros e desencontros vai sendo reconstruído pouco a pouco e mostram a História como uma força moldada pelo homem que, por sua vez, é capaz de moldar a vida de cada indivíduo.
O Tema de Lara (Lara's Theme), composto por Maurice Jarre, virou um clássico do gênero. A visão poética de Lean oferece imagens inesquecíveis. São marcantes cenas como a da estrela vermelha brilhando sobre a entrada do túnel no qual entram e saem trabalhadores, outra em que uma criança surge através da vidraça gelada na qual os galhos batem, o ataque da cavalaria contra os bolcheviques ou a maneira que os flocos de neve se transformam em flores, e uma flor se transmuta no rosto de Lara.

Dr. Jivago (Omar Sharif) é um humanista e um intelectual, um homem das artes e da medicina como Tchekov - ele nos conta uma história diferente da que nos mostram os livros: cheia de sentimentos pessoais de indivíduos comuns que amam e sofrem em qualquer época, turbulenta ou tranqüila. E nos lembram que o Estado qualquer Estado é formado por pessoas assim.

A narrativa é feita em flashback a partir do general do exército vermelho Yevgraf (Alec Guinness, da série Guerra nas Estrelas e Passagem Para a Índia) que interroga uma jovem (Rita Tushingham) na esperança de resolver um mistério de família: o que teria acontecido com sua sobrinha depois da morte do seu meio irmão, doutor Jivago?

O romance de Pasternak foi aclamado quando de sua publicação, em 1958, como um ousado desafio à censura russa. A política, porém, é apenas pano de fundo como em E o Vento Levou... a ideologia jamais passa para primeiro plano. Na verdade, a história começa na Rússia czarista, passa pela devastação da Primeira Guerra Mundial, o caos da Revolução Bolchevique, a Guerra Civil Russa, os expurgos e crises dos anos 20 e 30.

sábado, 5 de janeiro de 2008

Apocalypto

“Apocalypto” inicia-se com uma citação do filósofo, historiador e escritor Will Durant sobre Roma, referindo que uma civilização só é conquistada do exterior quando já se destruiu a si mesma. Supostamente, este filme versa sobre a civilização Maia, apesar dessa referência nunca ser explicitada. Mas nem sequer a sugestão de que “Apocalypto” possa ter algum fundamento histórico sustém a sua vacuidade.
“Apocalypto” conta a história de Pata-Jaguar (Rudy Youngblood), um jovem caçador de uma aldeia no meio da floresta tropical. Quando a sua aldeia é atacada por um grupo de guerreiros, o instinto de Pata-Jaguar leva-o a proteger a sua família. Mas quando é capturado a luta pela sua própria sobrevivência não é mais do que a luta pela sobrevivência daqueles que ama e que deixou para trás. Carregando este filme aos ombros, o estreante Rudy Youngblood plasma a transformação da inocência em agressividade, de um homem de família num astuto estratega.

“Apocalypto” é visualmente impressionante. Tem planos verdadeiramente criativos, um ritmo eletrizante e a lindíssima fotografia de Dean Semler. Da floresta verdejante à imponente cidade, as paisagens mexicanas e os cenários são de tirar o fôlego. Mas o fascínio de Mel Gibson por sangue, já patente em “The Passion of the Christ” (2004), parece ter-se agravado. “Apocalypto” é puro gore, e a sua qualidade técnica torna-o o extremamente violento. O espectador é forçado a superar imagens explicitamente cruéis (algumas delas tontas até) na esperança de que a história diante dos seus olhos se mostre digna desse esforço. Mas Gibson mostra apenas uma obsessão estética.

Se “Apocalypto” tem uma mensagem, ela não chega até nós. Tendo em conta os poucos diálogos (os que há, são em Maia), talvez seja mais fácil olhar para este filme como apenas um action movie, sem lhe pedir muito mais. Simplesmente, aproveitar a(s) sua(s) forma(s). Como as da loura que foge e grita durante todo um filme de terror. Com a diferença que aqui é um americano nativo – daqueles que Gibson provavelmente acredita que acabariam metidos em reservas, independentemente das chacinas dos colonos americanos. Tal como parece achar que a dizimação étnica dos conquistadores espanhóis foi consideravelmente irrelevante para o inevitável desaparecimento da sociedade Maia, marcada por fortes superstições e contrastes sociais.
Apesar desta visão parcial, não deixa de ser interessante fazer aqui uma leitura paralela para a nossa realidade: avisando-nos da destruição que nos espera se continuarmos a insistir nos nossos excessos.